Angola enfrenta um cenário preocupante no que diz respeito à saúde mental
28 de julho de 2024
Os problemas de saúde mental estão a tornar-se cada vez mais visíveis em Angola e demandam uma resposta urgente por parte das autoridades.
Há necessidade de uma intervenção abrangente e efetiva, que culmine na criação de políticas públicas robustas e eficazes para garantir o bem-estar mental dos cidadãos angolanos.
No contexto angolano, segundo a Psicóloga Ana Panzo existem indícios de alguns problemas preocupantes de saúde mental que se reflectem em problemas sociais. O suicídio, o infanticídio, o abandono de crianças na rua, o consumo excessivo de álcool, a dependência de jogos de apostas entre outros são alguns dos sinais da presença de tais patologias.
"Tudo isto são indicadores de que é necessário investirmos em saúde mental e indicadores de que existem problemas de fórum psicológico em Angola".
A especialista aponta ainda como exemplo casos, ainda que em número reduzidos, de adolescentes que cometeram suicídio em consequência da pressão social que sofreram.
O desemprego crescente em Angola tem um impacto significativo na saúde mental da população, especialmente entre os jovens. Segundo especialistas, a incapacidade de sustentar a família e a perda de perspetiva de futuro podem desencadear uma série de problemas psicológicos. Somado a isto, a fragilidade das relações familiares conjugais e os transtornos mentais muitas vezes não diagnosticados compõem um cenário alarmante para a saúde mental em Angola. Segundo o psicólogo e docente universitário Catarino Luamba, a situação é 'lastimável'.
"Naquilo que são as minhas observações enquanto profissional de saúde mental e investigador da mesma área, posso afirmar categoricamente que é um estado lastimável, péssimo. Existem vários indícios como o desemprego e a desestruturação familiar que já é um clássico", afirmou.
A dependência em jogos de azar e de apostas está cada vez mais comum entre os jovens angolanos. Para a Psicóloga Ana Panzo, não é apenas uma questão económica e financeira, por isso destaca que esta situação pode resultar em problemas de fórum mental e, por outro lado, com consequências para sérios problemas financeiros, familiares e sociais.
A especialista Ana Panzo explica que a partir do momento que um indivíduo se encontra desempregado e incapacitado para sustentar a sua família ocorre uma alteração do ponto de vista psicológico que se não for tratada ou equilibrado pode resultar em comportamentos que indicam anomalias na saúde mental.
"No caso de Angola há um declínio na questão do emprego e em consequência assiste-se um considerável número de jovens que se envolvem em jogos de aposta ao ponto de se tornarem dependentes psicológicos. Ali já não é a pressão financeira, mas também já há um prazer, há uma satisfação em fazer isto. Há casos de indivíduos que mesmo trabalhando acabam se tornando dependes deste jogo, depositando todo o salário nestas apostas. Isto é indicação de que alguma coisa não está bem", reforçou a especialista.
Os indicadores da crise psicossocial em Angola estão expostos nas avenidas de Luanda onde um número considerável de crianças realiza trabalhos diversos para ajudar no sustento de casa, devido ao aperto económico e financeiro por que passa a sua família. A gravidade da situação financeira, como aponta a Psicóloga Ana Panzo, fala tão alto que os progenitores perdem a noção de proteção das crianças.
"A questão financeira fala tão alto que a mãe perde a consciência de (...) não é responsabilidade da criança trazer mantimentos em casa, mas é responsabilidade dos pais. Quando isto já se perde, quando esta sensibilidade já não está ali, é porque alguma coisa não está bem com os angolanos e precisamos investir mais em saúde mental", acrescentou.
A instrumentalização da fé para fins abusivos e a manipulação psicológica de fiéis são problemas que exigem uma resposta urgente das autoridades e da sociedade civil. A prática de rituais religiosos extremistas por algumas seitas em Angola tem gerado preocupação crescente devido aos seus impactos negativos na saúde mental e social da população. Relatos de abuso sexual de crianças, sob o pretexto de "retirada de espíritos" e "cura de doenças", têm se multiplicado, expondo a vulnerabilidade de menores e a perversão de práticas religiosas.
De acordo com os analistas, essas práticas não apenas comprometem a saúde mental dos indivíduos envolvidos, mas também desestabilizam famílias e comunidades inteiras.
"A família é a base da sociedade, e quando ela é fragilizada por práticas nocivas como essas, a sociedade como um todo sofre as consequências", alerta Panzo.
A influência de fatores culturais, como a religiosidade, é outro elemento que se junta aos outros indicados pelos especialistas. As promessas de prosperidade feitas por algumas igrejas podem gerar expectativas irreais e, quando não são cumpridas, resultam em frustração e sofrimento psicológico.
Diante desse cenário, segundo o Psicólogo Catarino Luamba, a Plataforma Fala da Mente está a desenvolver um aplicativo para oferecer atendimento psicológico remoto, visando ampliar o acesso a serviços de saúde mental no seio da população.
A sociedade angolana precisa quebrar o tabu sobre a consulta com especialista de saúde mental e que haja mais políticas públicas relacionadas às patologias de fórum psicológico. Esta na hora de Angola ter uma reforma psiquiátrica e desenvolver um programa nacional de informação e sensibilização social sobre a saúde mental, alertaram os especialistas que falavam à Voz da América à margem da II Conferência sobre Saúde Mental realizada nos dias 26 e 27 deste mês pela Plataforma Fala da Mente.
"Que o Ministério da Saúde olhe para as questões de saúde mental. Esta na hora de Angola fazer uma reforma psiquiátrica, precisamos ter uma atenção especial virada a saúde mental. Precisamos de um programa nacional sobre a saúde mental para ajudarmos as pessoas que ainda tratam a questão da saúde mental como uma questão mística"
Fontes
[editar | editar código-fonte]- ((pt)) Agostinho Gayeta. Angola enfrenta um cenário preocupante no que diz respeito à saúde mental — Voa Português, 28 de julho de 2024
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