Arqueólogos revelam junção da cultura do Império Romano com tradições locais em porto do Oriente Médio
6 de fevereiro de 2025
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Arqueólogos brasileiros integram o grupo de pesquisadores que realizaram importantes descobertas sobre o período de ocupação romana na região que hoje corresponde ao norte de Israel, às margens do Mar Mediterrâneo, há mais de 2 mil anos. Os estudos identificaram vestígios da estrutura urbana implantada pelos romanos, como o traçado das ruas, as ligações entre espaços públicos, religiosos, comerciais, residenciais e indícios de galerias subterrâneas. A análise de moedas de Alexandria, Jerusalém e Roma mostrou que a região teve forte presença no fluxo de pessoas e mercadorias existente à época no Mediterrâneo Oriental, mantendo traços da cultura local, como o idioma e a religião.
O projeto se concentra no sítio arqueológico de Tel Dor, localizado na costa mediterrânea de Israel, cerca de 130 quilômetros (km) ao norte de Jerusalém e 30 km ao sul do Monte Carmelo e Haifa. “A cidade antiga, conhecida também como Dora na Antiguidade greco-romana e El-Burj ou Khirbet Tantura na era árabe, está situada em um grande monte costeiro que serviu como um importante porto ao longo de mais de 3 mil anos de história”, conta ao Jornal da USP o professor Vagner Carvalheiro Porto, do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP, um dos coordenadores do projeto. “Ao longo dos séculos, Tel Dor, ou simplesmente Dor, foi habitada por canaanitas, pelos enigmáticos ‘povos do mar’, israelitas, fenícios, assírios, persas, gregos e romanos”.
O foco dos estudos é o período romano da cidade de Tel Dor, do século I a.C. (antes de Cristo) ao século IV d.C. (depois de Cristo). “A pesquisa busca entender como os romanos impuseram seus conceitos urbanísticos na porção oriental do Império e de que maneira as populações locais receberam, adaptaram e transformaram essas influências”, afirma o professor do MAE. “Um foco específico é a análise da circulação monetária na cidade, associando as moedas encontradas nos estratos arqueológicos aos espaços urbanos para compreender o nível de monetização da sociedade local”.
“Os pesquisadores usaram técnicas avançadas de geofísica, incluindo o Ground Penetrating Radar (GPR), para conduzir levantamentos de radar e confirmar a localização das principais vias da cidade romana. Além disso, o projeto incorporou análises de imagens aéreas e modelagem tridimensional da superfície para mapear a organização do espaço urbano”, diz Carvalheiro Porto. “A técnica Reflectance Transformation Imaging (RTI) foi empregada para analisar moedas encontradas nas escavações, melhorando a visibilidade de detalhes iconográficos e inscrições desgastadas.”
- Tradições e Influências
De acordo com o professor do MAE, os elementos centrais do planejamento urbano romano eram o cardus maximus, a via principal das cidades, no sentido norte-sul, e o decumanus maximus, na direção leste-oeste. “Sempre que os romanos fundavam uma nova cidade, o que faziam com frequência ao longo do Império, começavam traçando essas duas vias”, conta. “O Fórum geralmente ficava na interseção delas, e, a partir desse eixo central, as demais ruas eram abertas paralelamente”, conta.
Os estudos geofísicos confirmaram a presença da grade urbana romana. “Os levantamentos também identificaram a posição do fórum e as interconexões entre os espaços públicos, religiosos, comerciais e residenciais da cidade”, destaca Carvalheiro Porto. “Além disso, foram encontrados indícios de uma galeria subterrânea sob o cardo maximus, sugerindo um sistema sofisticado de infraestrutura urbana.”
“A pesquisa em Tel Dor revelou um intenso fluxo de pessoas, bens e moedas de diversas regiões do Mediterrâneo, evidenciando uma dinâmica de interações locais e globais. A presença de moedas de diferentes cidades, como Jerusalém, Alexandria e Roma, demonstra a integração da cidade em redes comerciais e culturais mais amplas, ao mesmo tempo que mantinha características próprias”, explica o professor. “Do ponto de vista cultural, a cidade manteve a diversidade dos períodos fenício e helenístico [grego]. As práticas religiosas mostram essa mistura, com templos dedicados a divindades romanas coexistindo com cultos locais e fenícios.”
Segundo o professor, a infraestrutura urbana romana incorporou aspectos do planejamento helenístico, como ruas pavimentadas organizadas em um traçado ortogonal (grade de ruas paralelas e transversais). “As técnicas construtivas também refletiram essa continuidade, com o uso de pedras locais e materiais típicos das fases anteriores, como o basalto e o calcário, embora o concreto romano (opus caementicium) tenha começado a ser usado em algumas estruturas”, descreve. “O Fórum e outras estruturas públicas foram introduzidos seguindo o modelo de Roma, mas respeitando o tecido urbano anterior, evidenciando a fusão entre as tradições helenísticas e romanas.”
Fontes
[editar | editar código-fonte]- ((pt)) Júlio Bernardes. Arqueólogos revelam junção da cultura do Império Romano com tradições locais em porto do Oriente Médio — Jornal da USP, 5 de fevereiro de 2025