Presidentes do Brasil e Paraguai assinam novo acordo da Usina Hidrelétrica de Itaipu

Fonte: Wikinotícias

Agência Brasil

Assunção, Paraguai • 26 de julho de 2009

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Depois de quase um ano de negociações, o Brasil e o Paraguai definiram as bases de um acordo sobre a Hidrelétrica Binacional de Itaipu. Em um documento chamado Construindo uma Nova Etapa na Relação Bilateral, o Brasil concorda em triplicar a taxa anual de US$ 120 milhões que paga pela cessão da energia não utilizada pelo Paraguai.

O governo brasileiro também aceita que o vizinho e parceiro do Mercosul venda energia diretamente no mercado brasileiro, sem passar pela Eletrobrás, e renova as ofertas de criação de um fundo de desenvolvimento para projetos de integração industrial produtiva e de facilitação de financiamento para obras de infraestrutura no Paraguai.

Nada, porém, tem data para entrar em vigor. Alguns pontos deverão ser submetidos aos Legislativos dos países. Outros ainda serão detalhados por grupos de trabalho. Ainda assim, a assinatura do documento foi considerada um momento histórico pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Lugo, que trataram desse e de outros temas durante cerca de três horas na manhã ontem (25), na capital paraguaia.

Na prática, o Brasil não cedeu em pontos centrais das exigências paraguaias: o aumento da tarifa que paga pela energia que o Paraguai não utiliza e a possibilidade de o vizinho vender a energia que não usa para terceiros países. Com relação ao primeiro ponto, o Brasil concordou em aumentar de US$ 120 milhões para US$ 360 milhões a taxa anual de cessão (o Paraguai queria US$ 800 milhões). Hoje, o país paga US$ 43,8 dólares o megawatt/hora mais US$ 3,17 pela cessão. Essa taxa passará para US$ 9,51.

O aumento ainda será submetido aos Congressos dos dois países e, caso aprovado, não deve refletir na elevação do preço da energia no Brasil. “O presidente Lula não quer ver o consumidor penalizado por uma decisão dessa natureza”, assegurou o embaixador Ênio Cardoso, subsecretário para Assuntos da América do Sul do Itamaraty. “Como será a distribuição [do custo], dependerá de muitos entendimentos e, provavelmente, de várias reuniões entre o presidente e autoridades do setor energético e do setor financeiro e econômico do país”, ponderou.

Com relação à demanda de livre disponibilidade dos 50% da energia produzida por Itaipu a que o Paraguai tem direito, os dois países chegaram a um meio termo: criaram um grupo de trabalho para discutir se essa energia poderia ser vendida diretamente pela Agência Nacional de Energia do Paraguai (Ande), equivalente à Eletrobrás), às distribuidoras no mercado brasileiro. O resultado deve ser apresentado aos presidentes em três meses para depois ser submetido aos parlamentos de cada país.

Também deve ser analisada a viabilidade de que tanto o Brasil quanto o Paraguai possam vender energia a terceiros países a partir de 2023. Nessa data, o Paraguai deve acabar de pagar pela construção da usina e deve querer negociar novas regras para a usina binacional.

O mesmo grupo de trabalho estudará as condições para que a Ande possa vender, no mercado brasileiro, energia da Hidrelétrica de Acaray e da Represa de Yguazú.

Sobre a criação do fundo para investimentos de associação industrial e produtiva, os dois países não falaram em valores. O presidente Lula apenas reiterou a disposição de propor sua criação ao Congresso Nacional. Esse fundo contaria com recursos orçamentários. O presidente também reiterou a oferta de financiamento, “em termos favoráveis”, para obras de infraestrutura no Paraguai com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Programa de Financiamento às Exportações (Proex).

O Paraguai, por sua vez, informou ao Brasil que sua Controladoria está auditando a dívida que o país tem com a Eletrobrás e o Tesouro brasileiro pela construção de Itaipu. O resultado será apresentado ao governo brasileiro.

Ainda ficou acertado que a hidrelétrica arcará com os custos da modernizaçãode uma linha de transmissão entre Itaipu e Villa Hayes, ampliando a capacidade para 500 kv, o que permitirá que o Paraguai disponha de mais energia. Essa linha não será repassada ao Paraguai sem custo.

No Paraguai

A revisão do Tratado de Itaipu vem sendo reivindicada pelo Paraguai há anos e foi uma das principais bandeiras de campanha do presidente Fernando Lugo, eleito em 2008. Além de questionar a dívida de US$ 19,6 bilhões que o país tem com o Brasil, referente à construção da usina hidrelétrica binacional, o Paraguai pedia “preço justo” pela energia que não vende ao Brasil e o direito de comercializar aquilo que não consome a terceiros países.

Pelo tratado de construção de Itaipu, cada país tem direito a 50% da energia produzida pela usina e a energia não utilizada deve ser vendida ao sócio. Hoje, Itaipu fornece 90% da energia utilizada pelo Paraguai (o volume, porém, equivale a cerca de 5% dos 50% que o país têm direito. O restante é vendido à Eletrobrás).

Em reunião ministerial realizada em janeiro, em Brasília, o governo brasileiro apresentou, como contra-propostas, a criação de uma linha de crédito de US$ 1 bilhão, por meio do BNDES para obras de infra-estrutura no país vizinho, e de um fundo binacional para estimular a atividade produtiva no Paraguai. O Brasil também se propôs a dobrar a taxa de US$ 105 milhões paga anualmente pela cessão da energia excedente do país vizinho. O Paraguai não concordou.

As conversas mais uma vez não avançaram durante visita de Lugo ao Brasil, em maio. Na ocasião, 14 acordos em diferentes áreas estavam prontos para serem firmados, mas acabaram não sendo fechados devido às divergências quanto à Itaipu.

Nos últimos meses, os governos intensificaram as negociações. Na última quarta-feira, o assessor especial da presidência, Marco Aurélio Garcia, teve reunião de quase três horas com Lugo, e negociadores dos dois países se reuniram em busca de um acordo. Durante toda a semana, o tema foi manchete dos jornais paraguaios, sobrepondo-se à Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul, realizada no dia 23 em Assunção.

Ontem, às vésperas da Cúpula do Mercosul, Itaipu foi manchetes de todos os jornais paraguaios. Pelas ruas da cidade, faixas diziam “Itaipu, 50% da energia é nossa”. Para a população, o encontro entre os presidentes era muito mais importante que a cúpula regional. “Pode entrar dinheiro no nosso país”, justificava o taxista Carlos Gonzalez dias antes do encontro.

Em comunicado à nação, após a reunião com o presidente Lula, Lugo comemorou o acordo, lembrando que em dez meses foi possível conquistar algo que não foi obtido em 30 anos. Mas, segundo Lugo, em se tratando de Itaipu, não há vencedores ou derrotados. Para ele, o consenso foi uma vitória para os dois países.

No Brasil

O que era para ser uma entrevista coletiva dos presidentes do Brasil, Luíz Inácio Lula da Silva, e do Paraguai, Fernando Lugo, depois do encontro bilateral ontem (25), acabou se transformando apenas na leitura de um comunicado conjunto intitulado Construindo uma Nova Etapa na Relação Bilateral. Ao final da leitura do comunicado, Lula driblou o cerimonial e pegou o microfone para comemorar o consenso sobre a Hidrelétrica Binacional de Itaipu.

“O título da declaração demonstra, por si só, a disposição do Paraguai e do Brasil subirem alguns degraus na melhoria das relações entre o Estado brasileiro e o Estado paraguaio”, afirmou Lula no início de seu discurso de improviso. O presidente defendeu o processo de integração regional e reconheceu a responsabilidade do Brasil e da Argentina na redução de assimetrias com os sócios menores, Paraguai e Uruguai.

“Não interessa que o Brasil cresça e se desenvolva se seus parceiros não crescerem e não se desenvolverem”, disse Lula, lembrando as negociações entre o Brasil e a Bolívia por ocasião da nacionalização das reservas de gás e petróleo bolivianas. “Não faltaram brasileiros que queriam que nós endurecêssemos com relação aos companheiros da Bolívia. E eu sempre achei que um país tem que respeitar o outro para construir os acordos necessários para a manutenção da paz”, ressaltou.

É nesse contexto que entram as concessões feitas pelo governo brasileiro nas negociações sobre a Hidrelétrica de Itaipu. “Estou convencido que esse é um acordo histórico entre nós. Que nós governantes não podemos permitir que a carga ideológica de determinados tempos perpasse sempre a idéia de que acordos são impossíveis, de que um país é vítima do outro”, afirmou.

Fernando Lugo lembrou que tinha bandeiras “específicas” de campanha (a principal delas era a revisão do Tratado de Itaipu) e agradeceu a predisposição de negociação do governo brasileiro. “Estou seguro que nem todos no Brasil nem todos no Paraguai estarão satisfeitos com essa declaração conjunta, mas faz parte de um processo importante nas relações com o país irmão Brasil”, discursou o presidente paraguaio.

“Esta não é uma relação nem é um acordo onde uns perdem e outros ganham, nem vencedores nem vencidos. Aqui, sempre pensamos que os dois países têm que ganhar para o bem de nossos países e de nossos povos e para o bem de toda a região”, completou. “Aqui não há ganhador nem perdedor, Lula, ganhamos todos”, reiterou Lugo.

Os dois presidentes decidiram se encontrar a cada três meses para tratar de temas bilaterais – mesma freqüência com que o Brasil se reúne com o venezuelano Hugo Chavez. Já no próximo encontro, Lula e Lugo deverão aprofundar o que ficou acertado ontem (25) sobre Itaipu.

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